Na última reunião do Garotas pelo Mundo, discutimos sobre a pauta feminista, buscando entender as origens do movimento, assim como algumas de suas vertentes, e falar sobre algumas de suas discussões mais atuais.
O feminismo têm raízes que datam de algum tempo, tendo surgido com o movimento sufragista, no final do século XIX. As mulheres participantes de tal causa, brancas pertencentes à classe média alta, lutavam pelo direito ao voto em diversos países, apoiadas, muitas vezes, por maridos diretamente envolvidos na política.
A luta pelo sufrágio, assim, que representou a primeira onda feminista, não era livre de interesses políticos secundários, visto que muitas das participantes buscavam apenas, a partir da possível conquista, ajudar os maridos.
É importante analisar o contexto político e social dos Estados Unidos na época, já que as sufragistas do país tiveram grande influência em impulsionar e dar forças à causa. Tendo sido abolida em 1863, a escravidão ainda era um assunto extremamente recente e, por isso, a população negra recém liberta buscava, também, o direito ao sufrágio. As duas lutas simultâneas acabaram colidindo e uma rivalidade foi criada.
Os negros, que ainda eram muito desfavorecidos, defendiam a importância da conquista o mais rápido possível, para que pudessem sair do estado de extrema precariedade em que viviam. As mulheres, por sua vez, pareciam não entender aquela urgência, a diferença entre os dois grupos e a influência dos seus privilégios.
O assunto é abordado por Angela Davis em seu livro Racismo no Movimento Sufragista Feminino. “Para Douglass [defensor da libertação negra do século XIX], o voto não era um meio para garantir a hegemonia do Partido Republicano no Sul. Era basicamente uma medida de sobrevivência – um meio de garantir a vida da massa de seu povo”, diz a autora.
A conquista do direito pelo qual lutavam, logo, não tornaria os dois grupos iguais. A necessidade da concessão do voto a ambos é, evidentemente, a mesma; a urgência para tal, contudo, era diferente. E, a partir da negligência das sufragistas, que ignoravam um problema tão visível, é possível perceber o quanto o feminismo surgiu como um movimento excludente e elitizado, que ignorava muitos dos problemas e das vivências de mulheres negras e de diferentes classes sociais, por exemplo, e buscava resolver apenas os problemas das mulheres brancas. A expansão deste para outros grupos é muito recente e muito necessária.
Já na segunda onda feminista, que se iniciou em 1945 e engloba personalidades como Simone de Beauvoir, o movimento começou a sofrer uma lenta expansão para outros grupos e a participação de mulheres transgênero, por exemplo, deixou de ser tão mal vista em algumas vertentes da causa, o que configurou um mínimo avanço em direção à igualdade de todas as participantes. Apenas na terceira onda, entretanto, que se iniciou em 1980 e se estende até hoje (algumas pessoas acreditam que, na verdade, esta onda terminou em 2010 e, a partir daí, a quarta onda – a online – surgiu), o assunto da globalização do feminismo passou a ser discutido com mais força.
Cabe mencionar, também, a cultura raunch, que surgiu na terceira onda feminista. Ela se caracteriza pela apropriação da sexualização e da vulgarização das mulheres por elas mesmas, como forma de fortalecimento. Foi a partir disso que o feminismo se tornou mais conhecido, passando a ser mal visto por muitas pessoas que não concordavam com a forma de protesto utilizada por este movimento, em que as mulheres iam às ruas seminuas, reivindicando os seus direitos.
A partir do surgimento de novas vertentes, então, como o feminismo interseccional, que engloba, além de questões de gênero, questões relacionadas a raça e a classe social; outras vivências, além das que faziam parte do feminismo branco, passaram a ser consideradas e a luta se expandiu. A vertente reconhece que as mulheres não sofrem, juntas, as mesmas opressões, já que tantas outras questões estão envolvidas. O feminismo negro, mais tarde, se originou a partir dessa vertente e possui uma grande influência e importância no contexto atual.
Um avanço maior ainda é necessário, para que a igualdade plena dentro da causa seja completamente alcançada. Apesar de o feminismo branco já ter evoluído muito, passando a aceitar diferentes lutas, o privilégio ainda é visível, e isso deve ser analisado para que melhoras possam acontecer. Em um cenário de busca pela conquista da igualdade de gênero, a igualdade, inicialmente, entre as mulheres que lutam por isso é essencial. “Não se nasce mulher, torna-se”, dizia Simone de Beauvoir. A conquista, desta forma, é conjunta, e só poderá ser completa com a aceitação e a colaboração de todos os grupos, a partir do entendimento dos privilégios, das diferentes histórias de vida e das diferentes opressões que cada mulher sofre.
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